O maior conteúdo digital de cultura regional do Brasil
Registro das artes e culturas da Paraíba
O maior conteúdo digital de cultura regional do país
Registro das artes e culturas da Paraíba
Data de publicação do verbete: 27/11/2022

Peça Paraí-bê-a-bá

Parai-bê-a-ba” é uma peça teatral escrita em 1967 e encenada em 1968 sob direção de Paulo Pontes.
Data de publicação: novembro 27, 2022

Autor: Paulo Pontes

Em fins da década de 1960, algumas histórias não convencionais sobre a Paraíba foram contadas por meio de uma peça teatral. De um paraibano para outros, a peça reuniu autores, poetas, músicos, políticos, atores, atrizes e um coordenador geral paraibano para se atingir um ideal de comunicação com seus conterrâneos. Radialista, colunista de jornal, educador: diferentes experiências convergiram na consolidação da carreira profissional de Paulo Pontes no teatro, que teve início na década de 1960, por meio de um convite feito pelo dramaturgo e ator Oduvaldo Vianna Filho, quando de sua passagem pela Paraíba. Junto com ele e Ferreira Gullar, Paulo Pontes fundou o Grupo Opinião em 1964, dando início a sua carreira nos palcos. Com a cisão do grupo em 1967, retorna à Paraíba e coordena a dramaturgia do espetáculo Parai-bê-a-bá. 

Escrita em 1967 e encenada no primeiro semestre de 1968, tudo o que circunda Parai-bê-a-bá estava imbuído pelo contexto da ditadura civil-militar. Logo, a crítica social e política é imprescindível à compreensão da escrita de Paulo Pontes, sendo o diálogo com o povo, uma constante nas suas obras. Suas peças e textos televisivos eram baseados nas dinâmicas e nas mazelas sociais, sendo sua principal preocupação o tipo de cultura que estava sendo oferecido ao público. Assim, Pontes adota uma perspectiva cultural voltada para as questões populares, partindo sempre do cotidiano no qual estava inserido.

A forma utilizada para a elaboração da peça foi baseada na técnica da colagem, reunião de trechos de diferentes textos na formulação de um novo, destacando-se aspectos em comum entre os textos manipulados – como o tema ou uma mesma abordagem sobre um autor, personagem ou espaço.

Na peça, estão presentes, através dos seus textos (ou são mencionados como personagens), os escritores José Américo de Almeida, Oscar de Castro, José Lins do Rego, o cordelista Leandro Gomes de Barros, o intelectual Horácio de Almeida, o padre Francisco Pereira, os poetas Manoel José de Lima e Augusto dos Anjos, os cantores Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, o compositor João do Vale, e os políticos João Agripino Filho e João Pessoa, além de Euclides da Cunha. 

Os textos que compõem o espetáculo foram selecionados pelo padre Francisco Pereira, Altimar Pimentel, João Manuel de Carvalho, Jomar Souto e Paulo Pontes, com a atuação de Jomar Souto, Márcia Guedes Pereira, Sérgio Tavares, Roosevelt Sampaio, Socorro Albino, Walderedo Paiva e Ednald do Egypto. Com os arranjos e direção musical de Pedro Santos e Arlindo Teixeira, com a participação do Coral da Universidade Federal da Paraíba. 

Por iniciativa de João Agripino, governador da Paraíba em 1968, a peça foi apresentada em várias cidades, na primeira tentativa de “teatro volante” feita no Estado, alcançando recorde de público nos teatros locais. O percurso desta começou no Rio de Janeiro e seguiu até o sertão do Estado. A primeira apresentação ocorreu no V Festival Nacional de Teatro de Estudantes, onde a peça alcançou o 3º lugar geral. Depois disso, a peça estreou em terras paraibanas em fevereiro de 1968 no Teatro Santa Roza em João Pessoa. 

Após lotar o teatro, com a necessidade de sessões extras, a peça começou a percorrer cidades do interior do Estado, a saber: Campina Grande, Catolé do Rocha, Souza, Pombal, Itabaiana e Cajazeiras, sendo esta última a única cidade onde foi anunciada a peça, mas a apresentação não ocorreu.

Em Parai-bê-a-bá, a maioria dos personagens constituem representações do real: a ação se refere aos problemas, situações, diálogos e conflitos que, quando não transcritos integralmente, têm inspiração em situações que realmente ocorreram. Quando fala do homem do povo, do seu cotidiano, das suas características e gostos, o faz em oposição aos espetáculos teatrais que trabalham com temáticas humanas mais individuais, que tratam de questões introspectivas. O seu teatro, ao contrário, buscava representar a temática da multidão.

Na peça, há dois tipos de personagens: os que foram criados por Paulo Pontes e os que são recortes de outros textos. Os que foram criados pelo autor não apresentam nome próprio nem características físicas descritas em rubricas, são personagens que atuam em diferentes situações mas que não constituem uma trajetória no decorrer da narrativa; enquanto os personagens oriundos das colagens tem narrativas próprias, mantidas em coerência às obras originais mas que, ao serem deslocados para a peça, convergem para adensar o tema do texto, o paraibano. 

Quando o dramaturgo escreve Parai-bê-a-bá, escolhe a abordagem do paraibano enquanto trabalhador rural, elencando o homem do campo como representante do Estado. À época, a Paraíba era essencialmente agrária e dependente economicamente do agricultor, e, com o surgimento das Ligas Camponesas naquele contexto do pré-golpe, havia ainda uma representatividade social e política do trabalhador rural. É também sob essa perspectiva que a peça foi escrita, procurando evidenciar o trabalhador do campo como representante do homem do Estado. 

ATOR 2: O homem rústico que trabalha no campo quer ver o produto dos seus esforços. Tem a natural aspiração de passar melhor de casa e comida. Ele deseja, pelos seus esforços e economias, chegar a ser proprietário… embora modesto e pequeno, mas livre do desassossego de ser como simples locador. O sistema que divide latifúndio e moradores contrária, pela sua natureza, as aspirações íntimas do homem do campo, mata-lhe o gosto pelo trabalho, tira-lhe o amor à terra e transforma-o num homem sem interesse pelo seu trabalho e cheio de resignação. (PONTES, 1968, p. 32)

Mas, não é só de temas que evidenciam os problemas sociais que a peça foi escrita, o humor e a ironia diante das mazelas da vida aparecem como alívio cômico em respostas a essas situações.

No fim do espetáculo, o autor insere diferentes símbolos de representação do paraibano através de fatos históricos: a candidatura de João Pessoa a vice- -presidente na chapa de Getúlio Vargas concorrendo contra Júlio Prestes; o episódio da Revolta de Princesa Isabel que se autoproclamou Território Livre de Princesa Isabel durante a República Velha; o assassinato de João Pessoa, além de citar outros nomes de paraibanos que simbolizam a resistência, como o Índio Piragibe na luta contra a exploração francesa, a figura de André Vidal de Negreiros que contribuiu na expulsão dos holandeses, Branca Dias, João Pessoa e José Américo que resistiram através das suas experiências individuais.

O objetivo de Paulo Pontes era o diálogo com o povo, porém, como o público do teatro era restrito (normalmente a intelectuais e à classe média), havia sempre a necessidade de se atingir a comunicação com um novo público, advindos das classes operárias e populares. Esse diálogo se dava através dos grupos formadores de opinião, como jornalistas, professores, intelectuais, que eram (e ainda são) o público base do teatro comercial. Ao buscar, na literatura canônica paraibana, em diversos momentos históricos do Estado, nas músicas veiculadas e nos discursos que circulavam para o povo, a produção de Paraí-bê-a-bá visava alcançar o objetivo de aproximar o público do teatro bem como resgatar costumes culturais locais, entendidos por Paulo Pontes como elementos constituintes do homem paraibano.

 Euclides Nunes

Fonte: 

A União

https://auniao.pb.gov.br/servicos/correio-das-artes/edicao-digital-2020/correio-das-artes-outubro-2020.pdf