Lillyane Rachel
“Eu tô com as mana, tô com as mina, tô com as mona, tô com as gay. Em terra de ‘machocrata’ quem se desconstrói é rei. Se o corpo é meu é minha lei. E nessas fitas, que a gente parte pra cima, diversidade que ensina, conceito que contamina e a rima que disciplina, colada com as outras mina, eu tô com as trans, tô com quem respeita a vida”.
É o que diz um trecho da música ‘Campo Minado’ que descreve a resposta de mulheres em detrimento das violências impostas, historicamente, às minorias.
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Nascida a partir de um coletivo feminista constituído por artistas e produtoras focadas em ascender a representatividade das mulheres paraibanas no hip hop, a banda Sinta A Liga ganha vida em 2016 e assume os palcos com intuito de despertar identificação nas minorias da sociedade, como também, contribuir para a desconstrução de paradigmas e preconceitos socialmente instaurados.
Utilizando a homofonia, a nomenclatura do grupo faz alusão à peça do vestuário feminino na qual ‘A Liga’ remete à aliança e a união das mulheres, somada a fonia do ‘Cinta’, conjugada do verbo ‘sentir’, a fim de conduzir o público à emoção.
A banda atualmente composta pelas rappers e ativistas culturais Kalyne Lima, Camila Rocha, Preta Langy e pelo DJ e produtor musical Guirraiz, enfrenta e retrata o desafio de resistir social, cultural e musicalmente. Além de transmitir o talento e o potencial das integrantes, as composições autorais celebram a luta social salientando o poder feminino, a liberdade e sororidade.
De acordo com dados da Secretaria da Segurança e da Defesa Social da Paraíba, de janeiro a maio deste ano, 1855 inquéritos foram instaurados somando todos os registros feitos nas 14 delegacias distribuídas pelo estado. O número equivale a média de 12 inquéritos por dia de violência contra a mulher. Nesse período, 1988 medidas protetivas foram instauradas.
“As mulheres precisam ter os seus direitos garantidos, a gente sabe que o machismo não encontra barreiras e nem obstáculos para se estabelecer e isso, inclusive, também prejudica os homens. Através da nossa música, buscamos reforçar que temos o direito de ir e vir”, declara a rapper do grupo, Camila Rocha.
“A nossa representatividade precisa ser respeitada, o espaço que nos foi negado. Não queremos tirar nada de ninguém, apenas que as pessoas nos escutem porque é necessário ter o nosso espaço dentro da música paraibana e nordestina”, acrescentou Camila.
De acordo com ela, além de militância e empoderamento feminino, as letras das canções refletem vivências humanas possibilitando que a sociedade, de forma geral, seja tocada. “Se as mulheres estão seguras, todas as pessoas são afetadas, isso se espalha e penetra todos os âmbitos sociais”, ressalta. Exemplo disso, o produtor do grupo, Guirraiz, compartilha a experiência pessoal de estar inserido nesse contexto. “Me posiciono no papel de quem mais precisa aprender com essas questões. Defendo o feminismo e busco praticar ações que buscam equidade entre homens e mulheres. Na parte artística, tento contribuir para que o discurso seja apresentado com verdade e com o máximo de qualidade técnica e musical. É importante fortalecer o desenvolvimento do discurso que propagamos”, explica.
Com a capacidade de mesclar elementos culturais e reunir diferentes estilos musicais como o rap, dancehall, reggae e reggaeton, o protagonismo feminino ganha voz para a resistência em combate aos estereótipos e preconceitos em uma sociedade historicamente machista, xenófoba, racista e homofóbica.
O segundo EP do grupo lançado em agosto de 2018, “L4mb3”, traz o foco em prol da quebra de tabus, da liberdade e autonomia sexual das mulheres e contra a imposição de que os desejos, orgasmos e sensações devem ser retraídos. “Passa a tua língua na minha pele, ela se arrepia enquanto a gente se diverte. Esse meu tesão sei que te aquece, se joga direito, nesse jogo não tem cheque”, afirma uma estrofe da canção. “Eu sou doma indomável”, reforça outro verso.
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“Temos vivência enquanto paraibanas e nordestinas, nada mais justo do que incorporar toda a herança de poesia que já corre na nossa veia. A música é um escape para o ser humano, salva e liberta a gente. Isso nos impulsiona para buscar uma transformação social”, ressalta a outra rapper da banda, Preta Langy.